segunda-feira, 16 de julho de 2012

Em terra de surdo...



 Quem já passou pela frente do Shopping Boa Vista, no centro da cidade do Recife, numa sexta-feira à noite sabe que ali acontece, sempre, o encontro de surdos para socializar. Conversar. Namorar. Usar Droga... Enfim.
Nessa sexta-feira estávamos eu, o Kerlle de Magalhães e o Fernando Bessony, tomando umas cervejas. Terminando o dinheiro, que renderia mais cervejas, decidimos ir à Praça do Derby caminhando, para pegarmos o ônibus. Passava da meia-noite, meu ônibus não passava mais pelo bairro da Benfica. O Kerlle, que mora por ali, foi para casa. Eu e o Fernando fomos caminhando e conversando até chegar na praça do Derby. Chegamos. Decidimos pegar o ônibus no sentido centro, para fazer o retorno pela Av. Conde da Boa Vista. Depois de um tempo meu ônibus passou. Despedi-me do Amigo.
Dentro do ônibus, sentei e saquei um livro. (Inclusive de autoria do Kerlle e do Cícero Moraes. Havia acabado de ganhá-lo do próprio autor e amigo.) Se não me falha a memória eu estava no quarto poema, quando o ônibus parou no ponto de fronte ao shopping. Abriram-se as duas portas de trás. O ônibus foi invadido por cerca de sessenta pessoas. (todos tinham carteira de acesso livre, suponho.) Todos eles gritavam ( Depois, o Danillo Melo me falou que eles não percebem que estão gritando. No entanto gritavam desesperadamente.). Assustei-me, confesso.
Parei de ler. Decidi prestar atenção na algazarra. Só então percebi que eram todos surdos. Todos falavam através de sinais. Alguns eram até mais expressivos e davam uns gritos. Tentei voltar a ler. Em vão. Aquilo sugava minha atenção de curioso.
No ônibus, apenas eu, o motorista e o cobrador não entendíamos nada. Um casal de namorados se enamorava notoriamente. (Eufemismo, quase se comiam. Até pensei em oferecer uma camisinha.) Mais na frente uns dois se batiam e riam às gargalhadas. Ao meu lado alguns cheiravam “loló”. Foram cinco minutos de pura distração.
Desceram todos no Cais de Santa Rita. Provavelmente seguiram para o bairro do Recife Antigo. Voltei a ler.
Passei a entender como um diferente se sente em meio a uma sociedade de maioria igual. ( Sem preconceitos com a lingüística, por favor.) De uma coisa eu sei. Em terra de surdos, quem consegue escutar é quem tem deficiência.

-Gleison Nascimento, 16/07/2012-

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