Quem já passou pela frente do Shopping Boa Vista, no centro
da cidade do Recife, numa sexta-feira à noite sabe que ali acontece, sempre, o
encontro de surdos para socializar. Conversar. Namorar. Usar Droga... Enfim.
Nessa sexta-feira estávamos eu, o Kerlle de Magalhães e o
Fernando Bessony, tomando umas cervejas. Terminando o dinheiro, que renderia
mais cervejas, decidimos ir à Praça do Derby caminhando, para pegarmos o
ônibus. Passava da meia-noite, meu ônibus não passava mais pelo bairro da
Benfica. O Kerlle, que mora por ali, foi para casa. Eu e o Fernando fomos
caminhando e conversando até chegar na praça do Derby. Chegamos. Decidimos
pegar o ônibus no sentido centro, para fazer o retorno pela Av. Conde da Boa
Vista. Depois de um tempo meu ônibus passou. Despedi-me do Amigo.
Dentro do ônibus, sentei e saquei um livro. (Inclusive de
autoria do Kerlle e do Cícero Moraes. Havia acabado de ganhá-lo do próprio
autor e amigo.) Se não me falha a memória eu estava no quarto poema, quando o
ônibus parou no ponto de fronte ao shopping. Abriram-se as duas portas de trás.
O ônibus foi invadido por cerca de sessenta pessoas. (todos tinham carteira de
acesso livre, suponho.) Todos eles gritavam ( Depois, o Danillo Melo me falou
que eles não percebem que estão gritando. No entanto gritavam desesperadamente.).
Assustei-me, confesso.
Parei de ler. Decidi prestar atenção na algazarra. Só então
percebi que eram todos surdos. Todos falavam através de sinais. Alguns eram até
mais expressivos e davam uns gritos. Tentei voltar a ler. Em vão. Aquilo sugava
minha atenção de curioso.
No ônibus, apenas eu, o motorista e o cobrador não entendíamos
nada. Um casal de namorados se enamorava notoriamente. (Eufemismo, quase se
comiam. Até pensei em oferecer uma camisinha.) Mais na frente uns dois se
batiam e riam às gargalhadas. Ao meu lado alguns cheiravam “loló”. Foram cinco
minutos de pura distração.
Desceram todos no Cais de Santa Rita. Provavelmente seguiram
para o bairro do Recife Antigo. Voltei a ler.
Passei a entender como um diferente se sente em meio a uma
sociedade de maioria igual. ( Sem preconceitos com a lingüística, por favor.)
De uma coisa eu sei. Em terra de surdos, quem consegue escutar é quem tem
deficiência.
-Gleison Nascimento, 16/07/2012-
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